Não é o futuro que ameaça a escola — é a escola que ameaça o futuro, se não mudar!

 

Reflexão disponível para ouvir no Spotify ou You tube

A Escola Precisa de Mudar: Porque o Mundo Já Mudou

Vivemos um tempo curioso: o mundo gira cada vez mais depressa, mas a escola parece continuar presa a um tempo que já passou. Enquanto tudo à nossa volta se transforma; as tecnologias, as relações, as formas de comunicar, de aprender e até de trabalhar; a escola permanece, em muitos casos, ancorada a um modelo que foi criado para um mundo que já não existe.

Durante muito tempo, o objetivo da escola foi preparar cidadãos para integrar um sistema industrial. A organização das turmas, o silêncio das filas, os toques a ditar o ritmo do dia, a ênfase na memorização e na repetição... tudo isso fazia sentido num tempo em que se esperava que os jovens se tornassem trabalhadores disciplinados, metódicos, rápidos e obedientes. A escola funcionava como uma pequena fábrica de pessoas formatadas para cumprir tarefas, para seguir regras sem questionar, para competir em vez de colaborar.

Mas esse tempo passou. E se o mundo mudou (e continua a mudar), então é urgente que a escola acompanhe essa transformação.

Hoje, fala-se muito da inteligência artificial e do impacto que terá nas profissões. Alguns dizem até que a profissão de professor poderá desaparecer. Será mesmo? Talvez, se o professor continuar a exercer o seu papel como sempre fez — a falar para quem copia, a exigir silêncio sem escuta, a repetir fórmulas sem abrir espaço para o pensamento. Porque se o professor quiser ser uma máquina, então será facilmente substituído por uma. Mas o verdadeiro professor é insubstituível. Porque nenhum robô ensina com empatia. Nenhum algoritmo percebe o brilho no olhar de uma criança que acaba de compreender algo novo. Nenhuma tecnologia consegue criar uma relação pedagógica baseada na escuta, na emoção, no afeto.

O papel do professor precisa de se reinventar. Não para se tornar mais moderno ou digital, mas para se tornar mais humano. Para deixar de ser apenas transmissor de conteúdos e passar a ser construtor de contextos. Para deixar de avaliar apenas respostas certas e começar a valorizar perguntas profundas. Para deixar de controlar a sala e começar a inspirar a turma.

A relação com os pais: um novo entendimento necessário

Por outro lado, há também que refletir sobre a relação entre a escola e as famílias. Muito se tem dito sobre uma geração de pais que “questiona tudo”, que “não aceita regras”, que “tira autoridade ao professor”. Mas será mesmo só isso? Ou será que há, também, um corpo docente que permanece muitas vezes inflexível, fechado numa visão tradicional do que é ser professor?

Talvez os pais tenham percebido que o mundo mudou mais depressa do que a escola quis admitir. E talvez seja legítimo, até saudável, que questionem, que queiram participar, que defendam os seus filhos. É fácil apontar o dedo, mas talvez o convite aqui seja à escuta mútua. Porque nem tudo o que se fazia antes era certo. Durante décadas, toleraram-se gritos, humilhações, castigos e até o uso da régua ou da cana. Isso era aceite, normalizado — e é um alívio saber que hoje já não é.

Sim, deve haver autoridade. Mas não autoritarismo. O respeito não se impõe pelo medo. Constrói-se na relação, na presença, na confiança. E o professor que acolhe, que dá espaço, que escuta — esse é respeitado, não porque levanta a voz, mas porque sabe usar a sua voz com verdade.

Também as famílias têm um papel que não pode ser esquecido

Ao mesmo tempo, é importante que as famílias também se revejam com honestidade. Educar é difícil — e hoje, mais do que nunca, exige presença. Não apenas física, mas emocional. O excesso de permissividade, o “sim” constante, os ecrãs usados como babysitters, a ausência de momentos reais de convivência... tudo isso tem um impacto profundo nas crianças.

Não se constrói um ser humano inteiro sem limites. Não se ensina empatia sem tempo partilhado. E não se oferece segurança afetiva sem abraços, sem histórias, sem escuta. O desafio não é só da escola. A responsabilidade de educar não é delegável — é uma missão partilhada. E quando escola e família caminham em lados opostos, é a criança que fica no meio, sem chão.

Valorizar a infância é valorizar o tempo. É saber dizer “não” com amor. É usar os ecrãs com intenção, e não como fuga. É estar presente, mesmo que o dia tenha sido longo. É ensinar, com o exemplo, o valor da paciência, do cuidado, da escuta. Porque a escola não pode tudo. E porque os afetos que vêm de casa são o primeiro e mais importante espaço de aprendizagem.

Caminhar juntos para transformar

O que eu gostaria, eu, professora do 1.º ciclo com os sonhos reunidos no projeto id&ias em prática, não é uma revolução agressiva, mas uma transformação profunda. Uma mudança que comece por dentro: dentro das escolas, dentro dos professores, dentro das famílias. Uma mudança que entenda que educar é mais do que ensinar conteúdos. É formar seres humanos sensíveis, autónomos, críticos, solidários e criativos. É parar de preparar para um mundo que já não existe, e começar a preparar para um mundo que está por fazer.

A escola precisa de espaços de reflexão, de experimentação, de coragem. Precisa de escutar os seus professores e de lhes permitir criar, errar, repensar. Precisa de confiar nas crianças e nos seus ritmos. Precisa de criar pontes com as famílias, não muros. E precisa, sobretudo, de querer mudar — com intencionalidade, com delicadeza, com urgência.

Porque educar não é apenas preparar para o futuro. É transformar o presente. E esse presente começa agora.

Sem comentários:

Enviar um comentário

INTERESSANTE no id&ias em prática